Aula 02 – Howard Marks: Risco não é volatilidade, é a possibilidade de perder dinheiro

Descubra por que Howard Marks redefine o conceito de risco nos investimentos. Neste artigo, você vai entender por que volatilidade não é o verdadeiro perigo — e como evitar perdas permanentes seguindo os princípios do value investing.

VALUE INVESTING

Marcos Roberto Pinto

4/1/20254 min read

Quando você pensa em risco nos investimentos, o que vem à sua mente? Para a maioria das pessoas — e para boa parte da teoria financeira tradicional — risco significa volatilidade. Ou seja, um ativo que sobe e desce de forma brusca seria automaticamente mais arriscado do que outro que se mantém estável.

Essa visão está presente em diversos modelos matemáticos, como o CAPM (Capital Asset Pricing Model), em carteiras baseadas no desvio padrão e até nos sistemas automatizados de avaliação de risco usados por bancos e corretoras. Mas Howard Marks, um dos investidores mais respeitados do mundo e autor do clássico “O Mais Importante para o Investidor”, discorda frontalmente dessa abordagem.

Em suas palavras:

“Volatilidade não é risco. Risco é a probabilidade de um investimento dar errado de forma permanente.” — Howard Marks

Essa visão, simples e profunda, redefine completamente a forma de pensar o que é perigoso no mercado financeiro. Não é porque uma ação oscila que ela é arriscada. Da mesma forma, não é porque algo está ‘parado’ que é seguro.

Para entender melhor, vamos voltar no tempo.

Nos anos 2000, com a chegada da internet e a euforia em torno das empresas de tecnologia, surgiu a chamada bolha das “pontocom”. Gigantes como Amazon e eBay estavam entre os destaques, mas junto com elas vieram dezenas — talvez centenas — de empresas sem modelo de negócio claro, sem receita, sem lucro… mas com muito marketing.

O mercado comprava essas ações com entusiasmo, ignorando os fundamentos. O risco, aos olhos da maioria, era baixo: afinal, o preço só subia! Mas essa era justamente a armadilha.

Quando a bolha estourou, bilhões de dólares evaporaram. Empresas que pareciam “o futuro” simplesmente deixaram de existir. Aqueles que investiram com base em expectativa e não em valor real perderam tudo ou quase tudo.

Essa é a essência do que Marks ensina. O perigo não está na linha que sobe e desce no gráfico. O perigo está em pagar caro demais por um ativo que pode não entregar o que promete — e acabar com uma perda permanente.

Um bom exemplo positivo é a ação da Coca-Cola, que Buffett comprou no final dos anos 80. Na época, o papel não era barato em termos de múltiplos, mas Buffett viu um negócio simples, previsível, com marca global e retorno sobre capital altíssimo. Ele comprou e nunca mais vendeu. A ação passou por várias quedas e correções desde então, mas sua lucratividade e capacidade de crescimento a longo prazo geraram retornos espetaculares.

Se olhássemos apenas pela ótica da volatilidade, qualquer correção no preço da Coca-Cola poderia ser vista como um aumento no risco. Mas Buffett sabia o que tinha em mãos. Ele comprou valor. E o valor, como ele diz, não muda de uma hora para outra só porque o mercado está nervoso.

Outro exemplo, agora brasileiro, é o da Petrobras. Durante anos, a empresa apresentou oscilações de preço relativamente baixas, o que poderia sugerir um risco menor. No entanto, a companhia estava profundamente exposta a decisões políticas, à má gestão e à corrupção sistêmica, como revelado pela Operação Lava Jato. Em 2014, a ação despencou — e quem entrou antes, confiando na “estabilidade” dos preços, sofreu perdas severas. A estabilidade aparente mascarava riscos ocultos.

Howard Marks alerta sobre isso: o verdadeiro risco mora nas ilusões de segurança. Quando tudo parece calmo demais, é hora de redobrar a atenção. Em momentos de otimismo exagerado, os investidores tendem a ignorar os sinais de alerta. É por isso que ele diz:

“O risco é maior quando parece que não há risco.”

Esse tipo de raciocínio também aparece nos ciclos de mercado. Em seus memorandos, Marks frequentemente descreve o mercado como um pêndulo que oscila entre a euforia e o medo. E justamente por isso, ele reforça que entender o ciclo emocional do mercado é parte essencial de uma boa análise de risco.

Mas como colocar isso em prática?

Começa pela mudança de mentalidade: risco não é uma equação, é uma avaliação qualitativa, baseada em julgamento, contexto e fundamentos. Quando analisamos uma empresa, precisamos observar:

  • Sua capacidade de gerar lucro consistentemente

  • A qualidade da gestão

  • O nível de endividamento

  • O setor em que atua e as possíveis disrupções

  • A previsibilidade do negócio

Por exemplo, uma rede de supermercados pode parecer chata e sem glamour. Mas se ela cresce de forma constante, tem boa margem e reinveste bem o capital, pode ser um excelente investimento — mesmo que o mercado não esteja prestando atenção nela.

Por outro lado, uma empresa de tecnologia promissora, com muitas manchetes e pouca receita, pode carregar riscos enormes — mesmo que sua ação esteja “estável”.

Howard Marks e Warren Buffett se encontram nesse ponto. Embora usem linguagens diferentes, os dois acreditam que o risco só pode ser entendido com análise profunda, bom senso e conhecimento real do negócio. E, principalmente, que o maior risco é investir sem saber o que está fazendo.

Como Buffett disse certa vez:

“O risco vem de não saber o que você está fazendo.”

Essa visão mais racional do risco é o que separa o investidor de valor do especulador. O especulador corre atrás de retornos rápidos e se assusta com volatilidade. O investidor de valor busca lucros duradouros com base em negócios reais — e usa a volatilidade como oportunidade, não como ameaça.

Ao adotar a perspectiva de Howard Marks, você passa a enxergar o mercado com outros olhos. Em vez de fugir do ruído das oscilações, você passa a avaliar a solidez daquilo que está comprando. E isso muda tudo.

Na próxima aula, vamos entender como aplicar esse olhar ao selecionar empresas verdadeiramente previsíveis e lucrativas — o tipo de negócio que Buffett ama e que tende a reduzir o risco real: o de perder dinheiro de forma permanente.